quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Sonho e Realidade

     Lembro que de vez em quando chegava a sonhar com portas falsas, um fundo falso de gaveta, uma história mal contada e quando acordava o clima de mistério ainda pairava no ar. Mas era um mistério pobre, era um mistério só meu e de mais ninguém. E era este mistério que me dava forças pra viver. Eu não podia morrer enquanto não solucionasse tudo. Mas solucionar o que? Mentiras criadas por mim mesmo, para preencher meu mundinho vazio. Mentiras que de certa forma, anestesiavam minha solidão, tornavam-me um pessoa como outra qualquer, sociável, visível.
     Era dormindo que eu despertava. Nos sonhos eu podia ser o que quisesse. Algumas vezes guerreiro, outras vezes monstro, mas isso não importava, pois ao menos fazia parte de uma história. O estranho era que eu tinha medo da madrugada. Quando o dia ia morrendo e a noite chegava com seu canto insosso, meu coração ficava cinza. Talvez porque na madrugada eu ficava diante de mim. Na madrugada a solidão da minha alma se juntava com a solidão do próprio mundo. Tornávamos um só. Gélidos.
      Assim segui por muito tempo, vivendo nas sombras de fantasias surgidas dos meus sonhos. Até que ousaram me olhar e me viram. Trouxeram-me para o mundo real e eu descobri a verdadeira face da vida. Uma face cruel, má, impiedosa e totalmente atrativa. Tive minhas primeiras experiências e percebi que meu coração era diferente dos outros corações humanos, sempre confuso, triste e em busca de algo. Depois de tanto tempo sozinho, eu podia amar desesperadamente toda criatura carente de afeto. Mas isso não era uma característica boa, pois me tornei extremamente frágil e sensível, difícil de fazer feliz e fácil de magoar.
      E diante de toda essa beleza maligna, tornei-me mais um na multidão, agora eu estava no mundo. Eu finalmente tinha saído, não precisava mais construir falsas realidades, pois a verdadeira realidade estava perseguindo-me como um leão faminto persegue sua presa. E quando finalmente ela alcançou-me eu tive forças o bastante para dizer “ Eu não tenho medo de você, tenho poder o bastante para enfrentar-te. Consigo este poder em meus sonhos”.

Jeffew StrangerBlood

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Homem-menino-anjo!


     Ele chegou arfante ao terraço. Andou lentamente até a velha mureta de proteção e olhou a cidade.
     Que bela visão! À vários metros abaixo pequenos focos de luzes se agitavam feito vagalumes. Ele nunca tinha notado a beleza dos faróis dos carros.
     Lembrou-se de quando era um garotinho e ficava olhando o céu naquele mesmo terraço. Depois de muitos anos sentiu vontade de olhar as estrelas. Elas ainda estavam lá e sorriam pra ele. Ele chorou.
     Encostou as mãos na mureta e sentiu a frieza da cerâmica. Que mãos grandes! Ele tinha deixado o tempo passar. Uma brisa fresca fustigou-lhe o rosto e ele sentiu-se incomodado por aquele terno apertado. Retirou o paletó e afrouxou a camisa.
     “Que perfeição é a terra, a natureza!” pensou. “Como é belo o céu”. Quando criança sonhava em ser um anjo de grandes asas para aventurar-se entre as nuvens. Sonhava em ser um astronauta, ou até mesmo um piloto de avião. Mas agora, ele, pessoa grande, trabalhava em um escritório, perdido entre papéis e números. Vida inútil onde tudo dava errado!
     Homem inútil. Sem amigos. Sem amor. Sem história. Sem vida.
     Basta! Então o homem-menino- anjo respirou profundamente e olhou as estrelas mais uma vez. Subiu na mureta e abriu suas asas. Saltou cortando o espaço e voou... Por alguns segundos...


Jeffew StrangerBlood